Carro popular feito no Brasil terá IPI zero e pode ficar mais barato

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O governo federal está prestes a anunciar um programa de incentivo à venda de veículos mais baratos, com isenção de IPI até o fim de 2026 para carros de até 90 cavalos, movidos a biocombustível (inclusive flex) e fabricados no Brasil. Batizado de “Carro Sustentável”, o projeto é uma extensão do programa Mover e do IPI Verde, em elaboração pela Casa Civil. A informação foi confirmada pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC).

O objetivo é conter a crise na indústria automotiva, que enfrenta baixa produção, juros elevados e concorrência de importados, além de tentar reverter a baixa popularidade do governo, agravada pela derrubada do reajuste do IOF no Congresso. Atualmente, o carro zero mais barato do Brasil custa em torno de R$ 80 mil. A isenção do IPI, hoje em 7% para carros 1.0, pode reduzir cerca de R$ 5,5 mil no preço final de modelos como o Renault Kwid, cuja versão de entrada passaria de R$ 79.790 para R$ 74.204.

Onze modelos disponíveis no país atendem aos critérios, incluindo todas as versões de Renault Kwid e Fiat Mobi; configurações de Chevrolet Onix e Onix Plus; Citroën Basalt e C3; Fiat Argo; Hyundai HB20 e HB20S; Volkswagen Polo e Tera. Embora o desconto beneficie consumidores, sobretudo locadoras e frotistas terão maior impacto, pois compram em grandes volumes e têm acesso mais facilitado a crédito.

Especialistas apontam que, para o consumidor comum, a redução pode ser limitada. “O acesso a crédito barato é essencial para viabilizar esse crescimento na compra de carros, mas, no cenário atual, não tem sido fácil e barato obtê-lo”, alerta Helder Santos, da Fipecafi. Com taxas de juros anuais de até 29,5% no financiamento para pessoa física, o custo ainda é uma barreira significativa.

A renúncia fiscal do programa ainda não foi calculada, mas a operação semelhante, em 2023, demandou R$ 1,5 bilhão em poucos meses. O economista Igor Lucena destaca a contradição da nova proposta em um cenário de aperto orçamentário. “Criar um novo benefício agora parece contraditório”, observa. Leonardo Roesler, tributarista, reforça que a Lei de Responsabilidade Fiscal exige compensação imediata. “Sem isso, o governo poderá ter de aumentar outros tributos ou contingenciar despesas para cumprir metas primárias”.

Parte da compensação pode vir do imposto de importação sobre eletrificados, que será progressivamente elevado até 2026. O “carro sustentável” se insere no novo IPI Verde, contemplando critérios ambientais. Veículos simples terão isenção, enquanto carros potentes, importados e movidos somente a gasolina poderão enfrentar alíquotas maiores. No entanto, os detalhes dessa calibragem ainda não foram divulgados.

Em 2023, a redução de IPI e PIS/Cofins para veículos até R$ 120 mil impulsionou vendas por dois ou três meses, mas a demanda voltou ao patamar anterior. Segundo uma fonte do setor, “foi um efeito de curtíssimo prazo, concentrado em locadoras e frotistas. A população em geral continuou sem acesso ao carro novo”.

O conceito de “carro popular” não é recente. O primeiro programa foi lançado no governo Itamar Franco, em 1993, com isenção quase total de IPI para carros 1.0. Apesar do sucesso imediato, a política trouxe distorções no setor automotivo, como a quebra de empresas como a fabricante nacional Gurgel, que ficou de fora da medida.

Caso o IPI zero entre em vigor e o cenário de financiamento melhore, o programa pode fomentar vendas no curto prazo, especialmente para locadoras. Porém, a população geral pode sentir pouco efeito. “A indústria precisa de escala, mas também de previsibilidade. Sem um plano de longo prazo e sem reformas estruturais, vamos seguir remendando um problema que é muito maior do que o preço de tabela”, conclui um executivo do setor.

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