No Brasil, 21% das mulheres já foram ameaçadas de morte por parceiros atuais ou ex-parceiros, enquanto seis em cada dez conhecem alguém que passou por essa situação. A pesquisa “Medo, ameaça e risco: percepções e vivências das mulheres sobre violência doméstica e feminicídio”, realizada pelo Instituto Patrícia Galvão em parceria com a Consulting do Brasil, destaca que mulheres negras (pretas e pardas) lideram esses índices. O levantamento, divulgado nesta segunda-feira (25), foi apoiado pelo Ministério das Mulheres, com financiamento por emenda da deputada federal Luiza Erundina (PSOL-SP).
Entre as mulheres ameaçadas, 60% romperam com o agressor após a intimidação, sendo essa decisão mais frequente entre negras do que brancas. Apesar disso, apenas 30% das vítimas registraram queixa na polícia e 17% solicitaram medidas protetivas, que determinam restrições ao agressor. Cerca de 44% das vítimas relataram sentir muito medo, mas os dados refletem a opinião de duas em cada três mulheres de que agressores de mulheres permanecem impunes. Apenas 20% das entrevistadas acreditam que os culpados terminam presos. Para 60% das participantes, a impunidade contribui para o aumento dos casos de feminicídio.
A pesquisa foi realizada em outubro deste ano, com 1.353 mulheres acima de 18 anos, e identificou que 42% delas acreditam que as ameaças de morte nem sempre são levadas a sério pelas vítimas, que subestimam o risco real de assassinato. Por outro lado, 80% avaliaram que, embora a rede de atendimento às mulheres seja eficiente, ela não dá conta da crescente demanda. O mesmo percentual acredita que campanhas de denúncia e o uso de redes sociais são ferramentas eficazes no enfrentamento à violência. No entanto, 80% apontam que a Justiça e as autoridades policiais não tratam as ameaças e denúncias com a seriedade necessária. A maioria (90%) afirma que os casos de feminicídio aumentaram nos últimos cinco anos.
A história de Camila, sobrinha da diarista Zilma Dias, ilustra os dados alarmantes. Em 2011, aos 17 anos, Camila foi assassinada com 12 facadas pelo ex-companheiro em frente à filha do casal, Raíssa. Negra como a tia, a jovem engravidou e tentava se desvencilhar do agressor antes de ser morta. O ex-companheiro só foi localizado e condenado a 13 anos por feminicídio após cometer outro crime, o de falsidade ideológica. “Ela achava que ele não seria capaz de fazer algo assim”, desabafa Zilma, que também enfrentou violência doméstica e cárcere privado em sua vida. Para ela, a possessividade e o ciúme do agressor foram os principais fatores, como apontado na pesquisa por 89% das participantes.
Zilma, agora, busca dar visibilidade à causa e encorajar mulheres a romperem ciclos de violência. A pesquisa completa, junto com informações sobre violência doméstica, feminicídio e canais de ajuda como o telefone 180, pode ser acessada no site do Instituto Patrícia Galvão. As conclusões ressaltam a influência de fatores culturais e sociais, aliados à desconfiança no sistema de justiça, na perpetuação desse grave cenário de violência contra mulheres no Brasil.
Texto adaptado do Jornal A Folha do Sudoeste.