Plano para combate ao câncer de colo foca em rastreamento e vacinação

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Em 20 anos, o câncer de colo de útero pode se tornar uma doença residual no Brasil, caso o país implemente um novo plano nacional que busca avanços no rastreamento, tratamento e vacinação contra o HPV. Atualmente, este é o terceiro tipo mais prevalente de tumor entre mulheres brasileiras e figura como a quarta maior causa de morte, com cerca de 17 mil novos casos e cerca de 7 mil mortes anuais. Em quase 100% dos casos, o câncer está associado ao Papilomavírus Humano (HPV), sendo os tipos 16 e 18 responsáveis por 70% dos diagnósticos. Quase 65% das pacientes só descobrem a doença em estágios avançados.

Um dos destaques do novo Plano Nacional para a Eliminação do Câncer de Colo de Útero é a intenção de substituir o exame citopatológico, conhecido como preventivo ou papanicolau, por testes moleculares para diagnóstico do HPV no Sistema Único de Saúde (SUS). “É um teste que te permite saber a persistência ou não do vírus. As pessoas se contaminam com o HPV com muita frequência, em idade precoce, provavelmente 90% da população. Normalmente, esse vírus desaparece, mas quando ele persiste, tem possibilidade maior de desenvolver doenças associadas, levando a lesões precursoras e ao próprio câncer de colo uterino”, explica o diretor-geral do Instituto Nacional do Câncer (Inca), Roberto Gil.

De acordo com Gil, os testes moleculares disponíveis estão sendo validados para a escolha da melhor opção. Testes-modelo realizados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) indicam que essas tecnologias podem reduzir em 46% os casos de câncer de colo de útero e em 51% a mortalidade pela doença, índices superiores aos do método atual. O público-alvo da medida inclui mulheres, ou pessoas com útero, de 25 a 64 anos, especialmente aquelas que nunca realizaram o preventivo.

Outro avanço será a introdução do sistema de autocoleta, que permitirá que as pacientes colham o material sozinhas, sem necessidade de uma consulta ginecológica. “Um gargalo que a gente tem pra fazer o rastreamento é que muitas mulheres não vão ao posto ou se sentem intimidadas, principalmente se for um homem fazendo o exame. Como esse exame molecular é mais simples de ser colhido, começamos a trabalhar também com a autocoleta”, complementa o diretor-geral do Inca. O método está sendo testado em cidades de Pernambuco e São Paulo e começará a ser implementado de maneira escalonada a partir do início do próximo ano, com foco em regiões Norte e Nordeste, que têm as maiores taxas de mortalidade pela doença.

A ineficiência no rastreamento também impacta o início do tratamento. Embora a legislação brasileira estabeleça um prazo máximo de 60 dias para o início dos tratamentos, mais da metade dos pacientes só recebem terapias após esse período nas regiões Sudeste, Nordeste e Centro-Oeste. A situação no Norte é ainda mais grave: em 65% dos casos, o tratamento começa apenas após dois meses e a taxa de mortalidade por câncer de colo de útero na região é de 15%, enquanto a média nacional é de 6%. Por outro lado, o Sul tem o melhor desempenho, e em 44% dos casos o tratamento se inicia em até 30 dias.

A meta da OMS é que pelo menos 70% das mulheres realizem exames de alta performance para rastreamento, com 90% dos casos positivos sendo tratados rapidamente. O diretor do Inca detalha o percurso ideal: “Se você fez o teste e detectou o vírus, o ideal é que faça um exame de colposcopia, para avaliar se tem alguma lesão e fazer a biópsia quando necessário. Se for identificada lesão precursora, já fazer a excisão, e se tiver o diagnóstico da doença, com um carcinoma já instalado, a paciente deve ser encaminhada a um serviço de alta complexidade para tratar o câncer de colo.”

Para atingir esses objetivos, o Brasil precisa aumentar em 56% o número de colposcopias e em mais de 600% o de biópsias realizadas, o que demanda investimentos e organização da infraestrutura pública.

A vacinação contra o HPV é essencial para eliminar novos casos de câncer de colo de útero. Atualmente, a meta é vacinar 90% do público-alvo, que inclui meninos e meninas de 9 a 14 anos. Também estão elegíveis pessoas imunodeprimidas, vítimas de violência sexual e usuários de Prep (Profilaxia Pré-Exposição ao HIV) de até 45 anos. Para ampliar a cobertura, o Ministério da Saúde iniciou uma estratégia de resgate para jovens com até 19 anos que não foram vacinados na idade ideal.

Eder Gatti, diretor do Programa Nacional de Imunizações (PNI), explica o foco da campanha: “Esse é o público que ainda não entrou na vida sexual, ou seja, ainda não se expôs ao vírus. É o público com maior risco e, ao mesmo tempo, a melhor oportunidade de se proteger. Por uma questão de direcionamento dos esforços, considerando que o PNI é uma ação programática e preventiva, escolhemos esse grupo de 9 a 14 anos. Quanto mais tempo passa na vida da pessoa, maior o risco de ela já ter vivido situações de exposição ao HPV, que é um vírus muito comum. Então, em termos de resultado, acaba sendo melhor direcionar para os adolescentes.”

A vacinação contra o HPV no Brasil completa dez anos em 2024, com uma cobertura vacinal recente de 81,1% entre meninas, com picos de 96% no Paraná e apenas 43% no Acre. Entre os meninos, a cobertura média é de 56,9%, caindo para apenas 25% no estado acreano. Desde abril, o esquema de vacinação contra o HPV passou a exigir apenas uma dose, simplificando a imunização e alinhando-se às recomendações da OMS. Este ano, mais de 6 milhões de doses foram distribuídas para estados e municípios.

Segundo Eder Gatti, a prioridade para o próximo ano será aumentar a cobertura em municípios com índices baixos, com foco especial nos meninos.

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