Três em cada dez brasileiros com idade entre 15 e 64 anos não sabem ler e escrever ou têm dificuldade de compreender pequenas frases, identificar números de telefone ou preços. O percentual de analfabetismo funcional equivale a 29% da população, repetindo o índice registrado em 2018. Os dados são do Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf), divulgado nesta segunda-feira (5), e reforçam a necessidade de políticas públicas voltadas para reduzir desigualdades educacionais.
Outro dado preocupante revelado pelo Inaf está relacionado aos jovens. Entre pessoas com 15 a 29 anos, o índice de analfabetismo funcional subiu de 14% em 2018 para 16% em 2024. Os pesquisadores atribuem o aumento aos impactos das restrições impostas pela pandemia de Covid-19, quando escolas foram fechadas, prejudicando a continuidade das aulas.
O indicador classifica os participantes em diferentes níveis de alfabetismo com base em um teste aplicado a uma amostra nacionalmente representativa. Os níveis mais baixos, classificados como analfabeto e rudimentar, constituem o analfabetismo funcional. O nível elementar define o alfabetismo básico, enquanto os níveis intermediário e proficiente correspondem ao alfabetismo consolidado. Segundo o estudo, 36% da população estão no nível elementar, capazes de interpretar textos médios e realizar operações matemáticas simples. Outros 35% atingem o alfabetismo consolidado, enquanto apenas 10% alcançam o nível proficiente, no topo da escala.
Roberto Catelli, coordenador da área de educação de jovens e adultos da Ação Educativa, destaca o impacto amplo da falta de domínio da leitura e escrita: “Uma limitação muito grave”. Ele reforça que o avanço exige maiores esforços e ações planejadas: “Um resultado melhor só pode ser alcançado com políticas públicas significativas no campo da educação e não só da educação, também na redução das desigualdades e nas condições de vida da população. Porque a gente vê que quando essa população continua nesse lugar, ela permanece numa exclusão que vai se mantendo e se reproduzindo ao longo dos anos”.
Os dados também apontam desafios no ambiente de trabalho. Entre os trabalhadores brasileiros, 27% são analfabetos funcionais, 34% estão no nível elementar e 40% têm alfabetismo consolidado. Até mesmo entre pessoas com ensino superior completo ou mais, o índice de analfabetismo funcional chega a 12%, embora 61% dessas pessoas estejam no nível consolidado de alfabetismo.
Diferenças marcantes também são verificadas entre grupos populacionais. Entre brancos, 28% são analfabetos funcionais e 41% atingem o alfabetismo consolidado. Já entre negros, os índices são de 30% na faixa do analfabetismo funcional e 31% no consolidado. Entre os amarelos e indígenas, a desigualdade é ainda mais acentuada: 47% são analfabetos funcionais e apenas 19% têm alfabetização consolidada.
Esmeralda Macana, coordenadora do Observatório Fundação Itaú, parceira na pesquisa, defende ações educativas com maior abrangência e rapidez: “A gente vai precisar melhorar o ritmo de como estão acontecendo as coisas porque estamos já em um ambiente muito mais acelerado, em meio a tecnologias, à inteligência artificial”, afirmou. Macana também destacou que é necessário promover um aprendizado adequado desde a educação básica: “Precisamos garantir que as crianças, os jovens, os adolescentes que estão ainda, inclusive, no ensino fundamental, possam ter o aprendizado adequado para a sua idade e tudo aquilo que é esperado dentro da educação básica”.
O Inaf voltou a ser aplicado após uma pausa de seis anos. A edição mais recente contou com 2.554 participantes com idades entre 15 e 64 anos, que realizaram testes entre dezembro de 2024 e fevereiro de 2025 em todas as regiões do Brasil. A pesquisa buscou avaliar as habilidades de leitura, escrita e matemática da população, com uma margem de erro entre dois e três pontos percentuais, considerando a faixa etária analisada e um intervalo de confiança de 95%.
Pela primeira vez, o estudo inclui dados sobre alfabetismo no ambiente digital, avaliando os impactos das transformações tecnológicas. O Inaf é coordenado pela Ação Educativa e pela consultoria Conhecimento Social, com apoio da Fundação Itaú, Fundação Roberto Marinho, Instituto Unibanco, Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco).